Sem
dúvida alguma, o que mais rege as relações do ser humano é o afeto. Quando duas
pessoas se apaixonam e resolvem viver juntas não pensam em qualquer coisa que
não seja esse sentimento. Ocorre que nem toda relação é duradoura, e com o
término dela começam a surgir problemas que não haviam sido pensados
anteriormente, quando tudo eram flores.
Dentre
as questões a serem resolvidos com uma separação, à guarda dos filhos é a mais
complexa. Se antes era natural que o pai saísse de casa, provesse a família
financeiramente com o pagamento de pensão alimentícia e a mãe permanecesse no
lar com a guarda dos filhos, hoje isso é exceção.
Antes
de adentrar o conceito de guarda compartilhada, é importante entender a forma
de guarda unilateral.
O Código
Civil anterior ao de 2002 era totalmente patriarcal, ou seja, o homem era o
pilar da família e por ele eram tomadas todas as decisões. Dessa forma, a
mulher cabia à tarefa de cuidar do lar e dos filhos. Assim, quando se
separavam, era quase automático que a guarda permanecesse com a mãe.
Essa
forma de guarda pode ser consensual ou litigiosa, podendo ser de um dos
genitores ou de alguém que o substitua (art.1583,§1, CC/02). Quando um dos
genitores, normalmente o pai, sai de casa e deixa os filhos com a mãe, garante
a ela a guarda de fato, mas a de direito precisa de respaldo da justiça. Discute
o assunto Belmiro Pedro Welter:
a guarda unilateral não garante o desenvolvimento da criança e não
confere aos pais o direito da igualdade no âmbito pessoal, familiar e social,
pois quem não detém a guarda, recebe um tratamento meramente coadjuvante no
processo de desenvolvimento dos filhos (WELTER, 2009, P.56)
O
genitor que não possuir a guarda do menor deverá supervisionar seus interesses,
além de ter direito a visitação. Sobre o direito de visitas Waldyr Grisardo
Filho diz:
Diante de uma desunião, a finalidade desse instituto é a
manutenção de uma natural e adequada comunicação do filho com o pai ou mãe com
quem não convive, para fomentar e consolidar os vínculos paterno ou
materno-filiais, encurtando, quanto possível, o contato que existiria no seio
da família unida. A pendência desses processos deve repercutir minimamente
sobre os filhos mediante o regime de visita pretende-se, de certa maneira
mitigar a necessidade de convivência dos filhos com seus pais quando estão sob
a guarda de um só destes (GRISARDO, op. cit., p. 106-7).
A
discussão nesse ponto gira em torno de que somente períodos estipulados de
visitação não seriam suficientes para suprir as necessidades do menor. A partir
desse ponto, começou-se a discutir como diminuir necessidades e sofrimentos dos
filhos com a separação. Doutrinadores já encontravam no compartilhamento de
guarda uma solução, que foi adotada por tribunais e posteriormente virou lei.
Para
uma melhor compreensão de como se chegou à guarda compartilhada, é necessária
uma visão desde o advento do Novo Código, que tentou extinguir o poder do
patriarca, apesar de a sociedade ainda trazer resquícios desse molde de vida.
Começa-se então a introduzir a figura do pai não apenas no campo financeiro dos
filhos, mas também na área afetiva.
A
guarda compartilhada começou a ser utilizada primeiramente pelos tribunais, sem
que houvesse ainda uma lei especifica para ela. Alguns tribunais gaúchos foram
pioneiros nessas decisões. Porém, foi
com a Lei 11.698/2008 que
o instituto da guarda compartilhada foi regulamentado. A lição de Maria
Berenice Dias traz que:
Mesmo antes de
inserido de forma expressa na legislação, o modelo compartilhado não era proibido,
sendo amplamente aplaudido pela doutrina e admitido por alguns juízes. Além
disso, as disposições legais que tratam do bem-estar do menor e da igualdade
dos genitores traduzem parecer favorável a esse modo de exercício. Conforme
dispõe o Código Civil, no art. 1.634, dentre os deveres e direitos relacionados
ao exercício do poder familiar, são atribuídos a ambos os pais o de dirigir a
criação e a educação dos filhos e o de tê-los em sua companhia e guarda. A
separação judicial, o divorcio e a dissolução da união estável, não alteram as
relações entre os pais e filhos, como diz o CC, art. 1.632 (DIAS, 2010, p.437).
Após
a mencionada lei, a guarda compartilhada passa a ser regra, ainda que o casal
se encontre em litígio. Entretanto, deve sempre ser levado em conta o bem estar
do menor.
Com
a separação vêm também às frustrações com o relacionamento, que muitas vezes se
arrastam por anos, mas esse sentimento não pode ser levado em conta no processo
de guarda dos filhos, pois é a felicidade e o menor impacto na vida das
crianças que devem ser priorizados. Outro ponto importante a ser mencionado é o
da responsabilidade civil, que se antes era do genitor que detinha a guarda,
agora passa a ser de ambos.
A
guarda compartilhada não desobriga a fixação de alimentos, Maria Berenice Dias
aborda o assunto, apontando que nem sempre os genitores possuem condições
financeiras iguais, além de muitas vezes mesmo compartilhando a guarda, o filho
acabe vivendo apenas na casa de um dos pais, o que faz necessário o pagamento de alimentos (DIAS,
2010, p.438).
A
guarda compartilhada jamais deverá ser confundida com a alternada, que nem
mesmo é utilizada no ordenamento jurídico brasileiro. Essa forma de guarda se
caracteriza por uma divisão e não um compartilhamento, pois nessa modalidade o
filho vive metade do tempo com a mãe, metade com o pai, e os genitores tomam
decisões de forma isolada. Silva aborda o tema da seguinte forma:
Caracteriza-se pelo exercício da guarda,
alternadamente, segundo um período de tempo pré-determinado, que pode ser
anual, semestral, mensal, ou mesmo repartição organizada dia a dia, sendo que,
no período em que a criança estiver com aquele genitor, as responsabilidades,
decisões e atitudes caberão exclusivamente a este. [...] esta situação força a
criança a ficar sob o comando e educação de apenas um dos genitores durante
determinado período, sendo ao término desse período da criança terá que
sujeitar e adaptar à educação do outro genitor. (Silva, 2011, p. 127-128)
Um
aspecto importante que deve ser observado com a guarda compartilhada é como
fica o psicológico desse menor. É gritante o fato de que com a separação, os
filhos são os que mais sofrem, por ser o elo mais frágil da família. Na guarda
unilateral sofriam com a saída de um dos genitores de casa, em geral o pai, que
acabava por se distanciar afetivamente da prole. Evandro Silva comenta:
É crescente o número de pais
separados e filhos que chegam ao consultório, quer para orientações ou para
tratamento, quer por determinação judicial, para se submeterem a uma perícia
psicológica. 34 Nos primeiros casos, normalmente os filhos estão apresentando
alguns sintomas, que equivocadamente, são atribuídos à separação do casal.
Equivocadamente, porque aqueles sintomas não guardam relação com a separação,
mas sim, com a falta que faz o progenitor ausente, [...].É crescente o número
de pais separados e filhos que chegam ao consultório, quer para orientações ou
para tratamento, quer por determinação judicial, para se submeterem a uma
perícia psicológica. 34 Nos primeiros casos, normalmente os filhos estão
apresentando alguns sintomas, que equivocadamente, são atribuídos à separação
do casal. Equivocadamente, porque aqueles sintomas não guardam relação com a
separação, mas sim, com a falta que faz o progenitor ausente, [...]. (SILVA,
2005, p.14).
SILVA
(op. Cit., p. 15) aponta
ainda os casos recorrentes nos consultórios:
No âmbito do consultório, quando da avaliação
ou do atendimento a crianças filhas de pais separados, nota-se a presença de
sintomas que tiveram origem na separação dos pais. Na sua grande maioria, os
sintomas apresentados são: dificuldades cognitivas, ansiedade, agressividade e
depressão. No entanto, verifica-se que esses sintomas têm relação com a falta
que faz um dos pais e não com o distrato do casamento. Nas fantasias dessas
crianças, o progenitor ausente abandonou-as. Também observa-se que o
afastamento das crianças de um dos pais, decorre das desavenças conjugais e do
consequente 35 estabelecimento da guarda que não atende às necessidades dos
envolvidos.
Observa-se
que as doenças de cunho emocional se apresentam fortemente em filhos de pais
separados. A guarda compartilhada tende a diminuir essas ocorrências também,
pois cobra a participação de ambos os genitores nas decisões, convivência e
afetividade do menor. Contudo, é importante que os pais deixem de lado suas
desavenças e se foquem apenas no que é melhor para os filhos, lembrando-se
sempre que a separação ocorre entre um casal e nunca entre pai e mãe.
Importante observar que a guarda compartilhada é também usada nos casos de
dissolução de união estável ou mesmo quando os genitores sequer chegaram a
manter uma relação.
Infelizmente
mesmo com a guarda compartilhada e tantos outros esforços que visam minimizar
os danos aos filhos, existe um instituto que vem crescendo cada vez mais, qual
seja, o da alienação parental. Como dito anteriormente, com a separação vem
sentimentos negativos como fracasso, raiva, e é nesse ponto que entram os
filhos, que muitas vezes são usados como espécie de arma entre os cônjuges. A
alienação parental ocorre quando o alienador, que pode ser o pai ou a mãe,
imputa falsas acusações ao outro genitor, criando falsas memórias na criança e
a afastando do outro, fazendo, inclusive, com que se sinta culpada por ama-lo.
O tema é tratado por Priscila Maria Corrêa da Fonseca:
(...) é o afastamento do filho de um dos genitores, provocado pelo
outro, via de regra, o titular da custodia. A síndrome da alienação parental,
por seu turno, diz respeito às sequelas emocionais e comportamentais de quem
padecer a criança vítima daquele alijamento (FONSECA, 2006).
A
criança vitima da alienação parental pode vir a sofrer com doenças como
depressão, ansiedade, dentre outras. Trata-se de uma forma cruel de manipulação
e afastamento que deve ser combatida pela justiça e sociedade.
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