segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

DISCRIMINAÇÃO RACIAL E DIREITO INTERNACIONAL

A discriminação racial está presente nos dias de hoje, seja pelo horror que causa, seja pelas discussões. É preciso saber que a palavra “racismo” vem do Latim e traz a ideia de que exista uma raça melhor e mais forte que a outra. Dois grandes acontecimentos no século XX exemplificam isso, o Nazismo e a escravidão do povo africano. Porém, o primeiro contato do povo Europeu com pessoas diversas no momento em que colonizavam novas terras lá pelo século XV, já dava uma ideia do que era o racismo.
Sempre que usamos a palavra racismo, cuja origem vem do Latim e significa algo como categoria, nos lembramos da escravidão e do povo africano. De fato, muito se remete a questão racial ao que sofreram os negros, que em meados do século VI foram escravizados pelos povos europeus. Os africanos eram trazidos em navios negreiros, vivam em senzalas, sofriam todo tipo de violência física e emocional e sexual. Não há o que se contestar quando o assunto é o sofrimento vivido pelo povo negro. Entretanto, o racismo não ocorreu apenas com esse povo, a Segunda Guerra Mundial teve como principal objetivo exterminar uma raça, e nesse ponto os que mais sofreram foram os judeus. Mas o nazismo também se tratava de manter no mundo apenas uma raça chamada de “pura”, dessa forma, todos que não fossem caucasianos não deveriam existir. Esses dois exemplos são clássicos da origem dessa discriminação.
Engana-se quem acredita que o racismo teve fim com a libertação dos escravos ou o fim do Nazismo. Quando o povo negro foi liberto qual política de reparação lhes foi oferecida? Simplesmente foram jogados como animais, coisas, objetos sem valor a própria sorte. Sem trabalho, qualificação, moradia e apenas acostumados a servir, muitas vezes acabavam permanecendo nas casas de seus “senhores” em troca de comida. E isso foi sendo trazido século após século, pois quando começaram a sair das fazendas e a virem para a cidade, começam então a surgir os guetos, o desemprego, a violência, e esse povo fica à margem da sociedade, vivendo como sombras, que apesar de serem escuras como a sua cor, não são motivo de orgulho como ela.
A mesma situação aconteceu ao povo judeu com o término da Segunda Guerra Mundial, cidades devastadas, sem comida, sem dinheiro, na maioria dos casos sem família e com o horror vívido na memória.
Nas Américas, inúmeros foram os casos de discriminação racial também. O genocídio indígena nos Estados Unidos ocorreu em razão do governo entender que esse povo dificultava a construção de ferrovias e outras tantas coisas consideradas importantes para a “modernidade”. Outro acontecimento importante foi a Guerra Civil no mesmo país, que colocou frente a frente sul e norte, o primeiro querendo a manutenção da mão de obra escrava, interesse este ligado ao latifúndio, e o segundo que era abolicionista e industrial. O povo americano ainda enfrenta movimentos raciais e organizações como a Ku Klux Klan, organização racista.
Outro país a sofrer com o racismo é o Brasil, que tem sua história manchada pela escravidão e pela colonização violenta envolvendo nossos índios.
Nota-se que a questão racial está presente em todos os continentes, povos, em todas as partes do mundo, seja contra negros, ciganos, índios, mulçumanos, qualquer raça que não seja considerada “pura” pelos racistas.
Após esse breve apanhado acerca do que é o racismo e as formas em que ele ocorre, é importante também mostrar as politicas de reparação para esses povos, elas ainda são tímidas, mas já ocorrem. Para entender essas políticas e não julga-las é necessário entender que toda a discriminação sofrida pelas minorias gerou consequências graves. Como já dito, os negros que receberam a libertação, não detinham qualquer condição de sobrevivência, assim como os judeus, os índios, os ciganos e qualquer raça que tenha sofrido. Dessa forma, surgem meios de tentar reparar isso, a Alemanha pagou duras indenizações aos descendentes dos 6 milhões de judeus mortos. Quanto aos negros, muito se discute, mas pouco se faz para reparar o mal que lhes foi feito. No Brasil tem-se a questão das cotas raciais, muito debatidas e contestadas.
O Direito tem papel fundamental nessa caminhada de reparação e no Brasil, o Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº12.288/2010) tem como condão combater a discriminação racial:

"Art. 1o Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.
Parágrafo único. Para efeito deste Estatuto, considera-se:
I - discriminação racial ou étnico-racial: toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada;
II - desigualdade racial: toda situação injustificada de diferenciação de acesso e fruição de bens, serviços e oportunidades, nas esferas pública e privada, em virtude de raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica;
III - desigualdade de gênero e raça: assimetria existente no âmbito da sociedade que acentua a distância social entre mulheres negras e os demais segmentos sociais; IV - população negra: o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas e pardas, conforme o quesito cor ou raça usado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou que adotam autodefinição análoga.
V - políticas públicas: as ações, iniciativas e programas adotados pelo Estado no cumprimento de suas atribuições institucionais;
VI - ações afirmativas: os programas e medidas especiais adotados pelo Estado e pela iniciativa privada para a correção das desigualdades raciais e para a promoção da igualdade de oportunidades.
Art. 2o É dever do Estado e da sociedade garantir a igualdade de oportunidades, reconhecendo a todo cidadão brasileiro, independentemente da etnia ou da cor da pele, o direito à participação na comunidade, especialmente nas atividades políticas, econômicas, empresariais, educacionais, culturais e esportivas, defendendo sua dignidade e seus valores religiosos e culturais.
Art. 3o Além das normas constitucionais relativas aos princípios fundamentais, aos direitos e garantias fundamentais e aos direitos sociais, econômicos e culturais, o Estatuto da Igualdade Racial adota como diretriz político-jurídica a inclusão das vítimas de desigualdade étnico-racial, a valorização da igualdade étnica e o fortalecimento da identidade nacional brasileira.
Art. 4o A participação da população negra, em condição de igualdade de oportunidade, na vida econômica, social, política e cultural do País será promovida, prioritariamente, por meio de:
I - inclusão nas políticas públicas de desenvolvimento econômico e social;
II - adoção de medidas, programas e políticas de ação afirmativa;
III - modificação das estruturas institucionais do Estado para o adequado enfrentamento e a superação das desigualdades étnicas decorrentes do preconceito e da discriminação étnica;
IV - promoção de ajustes normativos para aperfeiçoar o combate à discriminação étnica e às desigualdades étnicas em todas as suas manifestações individuais, institucionais e estruturais;
V - eliminação dos obstáculos históricos, socioculturais e institucionais que impedem a representação da diversidade étnica nas esferas pública e privada;
VI - estímulo, apoio e fortalecimento de iniciativas oriundas da sociedade civil direcionadas à promoção da igualdade de oportunidades e ao combate às desigualdades étnicas, inclusive mediante a implementação de incentivos e critérios de condicionamento e prioridade no acesso aos recursos públicos;
VII - implementação de programas de ação afirmativa destinados ao enfrentamento das desigualdades étnicas no tocante à educação, cultura, esporte e lazer, saúde, segurança, trabalho, moradia, meios de comunicação de massa, financiamentos públicos, acesso à terra, à Justiça, e outros. Parágrafo único. Os programas de ação afirmativa constituir-se-ão em políticas públicas destinadas a reparar as distorções e desigualdades sociais e demais práticas discriminatórias adotadas, nas esferas pública e privada, durante o processo de formação social do País."

Apesar de hoje as condições de vida dos jovens negros, por exemplo, são melhores que as de seus antepassados, ainda há muito o que fazer, visto que não há igualdade da mesma forma. No Brasil tem-se a questão das cotas raciais, muito debatidas e contestadas.
No âmbito internacional, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de discriminação racial, criada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, aparece como um importante documento e traz em seu artigo 4º uma ideia de seu papel:

“Artigo 4º - Os Estados-partes condenam toda propaganda e todas as organizações que se inspirem em idéias ou teorias baseadas na superioridade de uma raça ou de um grupo de pessoas de uma certa cor ou de uma certa origem étnica ou que pretendam justificar ou encorajar qualquer forma de ódio e de discriminação raciais, e comprometem-se a adotar imediatamente medidas positivas destinadas a eliminar qualquer incitação a uma tal discriminação, ou quaisquer atos de discriminação com este objetivo, tendo em vista os princípios formulados na Declaração Universal dos Direitos do Homem e os direitos expressamente enunciados no artigo V da presente Convenção...”

O Dia Internacional De Luta Pela Eliminação Da Discriminação Racial foi criado pela ONU, esta, aliás, possui um importante papel no combate a qualquer tipo de preconceito. Esse dia acontece para homenagear os mortos e feridos no Massacre de Sharpeville, onde pessoas negras faziam um protesto pacífico contra uma lei que as obrigava a portar um cartão que continha os locais onde poderiam circular. O Direito Internacional combate a discriminação, as políticas de reparação e afirmativas existem, mas ainda há muito que se fazer para que a raça não seja motivo de guerras e preconceitos, sendo todos respeitados em suas igualdades e diferenças.

BRUNA GEBARA




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